A
Bruxa estreou em circuito reduzido de salas, até estranhei a sua
vinda para Ribeirão Preto, amparado por um hype
demasiado positivo que chegou a causar frustração nos fãs de terror acostumados
aos maus exemplares contemporâneos do gênero. Um dos meus colegas de trabalho
disse que morreu de tédio durante a projeção, desqualificando o filme, cuja
campanha de marketing o havia instigado a assisti-lo - sua expectativa era obviamente
outra. A Bruxa definitivamente não
pertence à vertente de filmes de terror calcada quase exclusivamente na
violência gráfica, que a propósito, já rendeu ótimos exemplares do gore ou slasher movie.
O diretor Robert Eggers investe bastante
na ambientação do longa-metragem ao transportar o espectador para a Nova
Inglaterra do século dezessete, investindo no rigor das composições dos
quadros, nos figurinos, no espaço que cerca os personagens (a Natureza
ameaçadora) e na interpretação dos seus atores. O roteiro explora com maestria a
dicotomia bem versus mal, tendo a religião e a figura de Deus representada no
primeiro e a bruxa representada no segundo. O filme se sustenta todo na tensão
proporcionada por esse choque, com alguns poucos momentos de alívio emocional.
Mesmo com poucos recursos em mãos, o resultado acaba sendo extraordinário.
O mal espreita a família protagonista de
protestantes (pai, mãe e cinco filhos) o tempo todo, testando a fé dos seus membros
contra as suas próprias fraquezas. São antológicas as materializações carnais dessa
entidade maligna, sobretudo aquelas que investem na sensualidade e sexualidade
do avatar da bruxa. Mesmo a caracterização clássica da “velhinha com a ruga na ponta
do nariz” não deixa a desejar, provavelmente influenciada pelas imagens
distorcidas do Fausto (2011), de Aleksandr Sakurov.
No final das contas, o filme comporta uma
miríade de leituras, podendo ser facilmente constatado pelas diversas
abordagens críticas que pipocam na internet. A mim sobressaiu-se o rito de
passagem da filha adolescente rumo à vida adulta, tendo a sua sexualidade
reprimida pela influência machista e religiosa, bem características do período histórico
retratado. O desfecho é assustador, embora também seja libertador. Existe uma
energia encubada nesse ambiente opressor explorado pelo filme, cujo
desprendimento alivia o espectador. O ritual de libertação é macabro,
despertando uma sensação ambígua de alívio e desconforto. Essa ambiguidade que
alimenta essas forças mutuamente opostas, a ponto de embaralhar a percepção do
espectador, enriquece a fruição do filme. O “lado negro da força” se mostra
demasiado sedutor para ser descartado com tamanha facilidade. A jovem Thomasin
(Anya Taylor-Joy) é praticamente uma Carrie
(Brian De Palma, 1976), tentando domar as energias difusas da sua
sexualidade recém aflorada.
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