segunda-feira, setembro 16, 2013

The Bling Ring (Sofia Coppola, 2013)


Eu entendo perfeitamente quem considera os filmes da Sofia Coppola chatos: ela repousa um olhar atento, alongado, minucioso sobre seus personagens endinheirados, normalmente famosos (ou em busca da fama), conduzindo a sua câmera observadora por “longos momentos desinteressantes”. Seus personagens estão sempre entediados, vagando solitários pelo mundo, tentando encontrar alguém ou alguma coisa que preencha o vazio de suas vidas ordinárias (a despeito de todo o glamour que as rodeia). Mas daí a considerar seus filmes ocos ou desprovidos de interesse são outros quinhentos.

O material que ela tinha em mãos para realizar The Bling Ring (2013) poderia sem muito esforço acabar terminando em mais um filme de Amy Heckerling (As Patricinhas de Beverly Hills, 1995). O assunto é muito bom e a tentação em empregar um tom sensacionalista ao relato não deve ter sido pouca (coisa que Hollywood gosta de fazer bastante). O filme de Sofia aborda esse sensacionalismo sem fazer dele o seu principal foco de interesse – a cena do tribunal, que evita o julgamento, é um bom exemplo. Sua câmera permanece o tempo todo centrada em seus personagens.

Aos que dizem que ela mantém um olhar isento, carente de julgamento, eu discordo. A personagem de Leslie Mann, Laurie, que faz a mãe de Nicki (Emma Watson), não precisaria constar no filme. Sofia, também roteirista, poderia abrir mão dela e se concentrar apenas na saga dos adolescentes, tornando sua presença meramente ilustrativa. As poucas vezes em que ela aparece em cena, especialmente no momento da entrevista a Nancy Jo Sales, são determinantes para ampliar o escopo de observação da diretora: o filme deixa de ser apenas sobre os jovens retratados e passa a ser de toda uma sociedade, doentia com a ideia de fama e estrelato. Ninguém sai ileso.

sexta-feira, setembro 13, 2013

Barbara (Christian Petzold, 2012)


A comentada aproximação entre A Vida dos Outros (Florian Henckel von Donnersmarck, 2006) e Barbara é oportuna uma vez que ambos os filmes retratam o modus operandi da Stasi, polícia secreta e inteligência da República Democrática Alemã (RDA), seja do ponto de vista de quem a integrava, no primeiro caso, seja da perspectiva de quem era perseguido por ela, no segundo caso. A despeito das preferências pessoais de cada um, uma sessão dupla daria um belo programa. As duas abordagens convergem para o mesmo ponto de interesse: a opressão reprime a emoção de todas as partes envolvidas, no que se convencionou chamar de jogo perde-perde, uma vez que todos saem prejudicados.

Eu gostei de A Vida dos Outros quando do seu lançamento, mas confesso que o filme foi perdendo espaço em minha memória afetiva a ponto de quase extinguir. Restaram, basicamente, o retrato da Stasi e o desempenho dos atores Ulrich Mühe e Sebastian Kock. A sessão de Barbara resgatou A Vida dos Outros do limbo da minha memória, só não sei se para o bem, já que na comparação ele sai perdendo.

A análise de A Vida dos Outros praticamente se encerra no descortinamento do modus operandi da Stasi, todo orquestrado por meio de um de seus burocratas, surpreendentemente tocado pela vida de um de seus investigados (o que é tomado praticamente como um disparate, um absurdo, dada a famosa frieza alemã e a rigidez do regime). Tudo no filme funciona em função dessa premissa, a partir da qual se explora a crise moral do protagonista. Barbara é bem mais rico, operando em outros níveis de interpretação não circunscritos apenas à questão da Stasi, muito embora a sua influência represente o vetor adequado para potencializar o efeito dramático de todos os outros desdobramentos. O filme funciona como uma crônica eficiente das virtudes bucólicas da vida no campo ante a vida angustiante na cidade grande, bem como um thriller minimalista de espionagem que reconstitui um período nebuloso da história alemã - ao estilo da safra recém-premiada de filmes romenos. Ainda pode ser visto como o registro da jornada de uma médica, forçada a exercer a prática de seu ofício em uma região inóspita, carente de recursos, embora hospitaleira e cheia de humanidade - qualquer semelhança com o programa Mais Médicos da nossa presidente é mera casualidade. O romance entre os pares é quase uma afronta, um ultraje, que aflora de forma improvável, curiosamente alimentado pelos diferentes backgrounds dos seus protagonistas - a cena do quadro de Rembrandt é muito boa - e pela vigília constante a que são submetidos. Não fossem essas condições adversas, dificilmente a aproximação entre eles seria levada a cabo; a força para enfrentar essa situação incontornável vem do reconhecimento da necessidade do outro. O desfecho é soberbo, acomoda perfeitamente o destino de todos os personagens sem forçar a barra. Nenhuma ponta fica solta.