quarta-feira, novembro 30, 2016

A Chegada (Denis Villeneuve, 2016)


Eu não sei por quanto tempo o impacto de A Chegada vai permanecer comigo, mas torço para que seja duradouro. Assim como outros filmes do mesmo diretor Denis Villeneuve (Incêndios, Suspeitos e Sicário), este também tem o mérito de sustentar um suspense intrigante na primeira parte, de caráter mais mundano, envolvendo impactos bastante abrangentes, até que o drama pessoal do(a) protagonista começa a se fundir ao escopo mais amplo do roteiro. Seus filmes exploram questões que nos dizem respeito a todos, a violência/truculência/guerra se manifesta sempre de alguma forma no fluxo inexorável da narrativa, dividindo espaço com as angústias/inseguranças/incertezas do(a) protagonista em um nível mais íntimo. Parte-se da humanidade, da população, da sociedade para se atingir o drama do indivíduo (o todo pela parte).

Não tenho dúvidas de que esse seja o seu projeto mais ambicioso, porque a conexão da parte com o todo se faz num grau mais rarefeito, quase abstrato, numa narrativa que explora uma relação arriscada entre uma "invasão" alienígena e uma mulher sensível, especialista em linguagem e comunicação, que ainda não se recuperou da perda da sua filha. Spielberg conseguiu algo parecido em Contatos Imediatos do Terceiro Grau (1977), que, coincidentemente, considero o seu melhor filme - é interessante observar a diferença de abordagem entre os dois cineastas, em que a influência infantil de Spielberg fica mais evidente (presente em boa parte da sua filmografia), sem que isso represente qualquer juízo de valor, não passando de uma mera constatação.

Tanto lá quanto aqui, a comunicação é o cerne da questão, não apenas a tentativa de comunicação praticada entre os humanos e os extraterrestres, mas, sobretudo, aquela praticada entre os próprios seres humanos (a primeira servindo de metáfora para a segunda). Enquanto eu via o filme, ou mesmo após o seu término, Gravidade (Alfonso Cuarón, 2013) e Interestelar (Christopher Nolan, 2014) me pareceram influências mais óbvias. Mas agora que raciocino a respeito dele para escrever essas linhas, Contatos Imediatos me parece uma comparação mais justa, certo de que minha memória não está me traindo.

O filme explora a nossa incapacidade de se comunicar, de se entender, que não raro culmina na ruína das nossas relações, bem representada pela afobada intervenção das forças armadas, recorrendo ao aparato bélico para dizer a que veio (a sequência que estabelece essa decisão gera uma discussão interessante, quando a diferença entre "weapon" e "tool" instaura um ambiente inseguro em que pairam apenas incertezas e medo). Mas ele não fica restrito a essa esfera. No nível mais íntimo, pessoal, o filme explora o poder imensurável do afeto, da aproximação, do toque, culminando num abraço de redenção absoluta, dos personagens e do público, carregado de energia e emoção. Terminada a sessão, eu só desejava estar nos braços dos meus filhos e minha esposa, exaurido pela jornada de desencontros que a heroína Louise Banks (Amy Adams) acabara de enfrentar. O caminho para o entendimento só encontra espaço para se manifestar no diálogo, ainda que seja sacrificante para uma ou ambas as partes.