As pessoas sempre fazem as coisas por dois motivos, o bom e o verdadeiro.
J.P.Morgan
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Jackson Bentley: I´m looking for a hero.
Prince Feisal: Indeed, you do not seem a romantic man.
Jackson Bentley: Oh, no! But certain influential men back home believe the time has come for America to lend her weight to the patriotic struggle against Germany… and Turkey. Now, I´ve been sent to find material that makes this war seem more…
Prince Feisal: Enjoyable?
Jackson Bentley: Oh, hardly THAT, sir. But to show it in its more… adventurous aspects.
Prince Feisal: You are looking for a figure that will draw your country towards war?
Jackson Bentley: All right, yes.
Prince Feisal: Lawrence is your man.
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Jackson Bentley: What is it, Major Lawrence, that attracts you personally to the desert?
T.E. Lawrence: It's clean.
Quando Lawrence (Peter O'Toole) responde
a essa questão do jornalista Bentley (Arthur Kennedy), sua condição no deserto
já se encontra plenamente estabelecida, tanto do ponto de vista pessoal, da
adaptação corpórea à adversidade climática, como do ponto de vista da
influência, política e/ou emocional. Esse momento representa o auge da sua
trajetória, no retorno triunfante à frente de batalha, equilibrando os
interesses dos árabes de um lado, e dos ingleses do outro. O espectador a essa
altura já enxerga um panorama mais pessimista, incentivado pela chegada do tal jornalista
americano pragmático, cujos comentários não escondem o interesse da futura potência
em acomodar as forças conflitantes conforme a sua conveniência e o proveito dos
britânicos.
Assistir a Lawrence da Arábia no cinema é um sonho. É o típico filme que não
cabe na tela diminuta de um televisor. A magnitude das cenas no deserto exige a
dimensão alcançada pelo projetor cinematográfico para ser devidamente
apreciada. O presente foi proporcionado pela rede de cinemas Cinemark, num
esforço louvável para relançar em cópias digitais (de matrizes restauradas)
alguns filmes que ganharam status de cult. Na primeira leva estiveram presentes
O Poderoso Chefão (Francis Ford Copolla,
1972) e Quanto Mais Quente Melhor
(Billy wilder, 1959), cuja oportunidade de vê-los na tela grande eu já
tive. A segunda temporada promete Taxi
Driver (Martin Scorsese, 1976), Laranja
Mecânica (Stanley Kubrick, 1971) e Pulp
Fiction (Quentin Tarantino, 1994).
Na primeira ocasião em que eu vi Lawrence da Arábia, o ego do personagem
não me pareceu tão inflado. Desta vez eu me dei conta do quanto a sua personalidade
influenciou os desdobramentos bélicos originados na região do Oriente Médio,
atuando como uma espécie de conselheiro logístico pela independência dos
árabes. Suas emoções estão nitidamente estampadas em seus trajes, alterando
conforme a ocasião - o figurino assume um papel dramático, inclusive espelhando
a sua vaidade. Sua indumentária é o reflexo perfeito da sua postura ideológica
pontual, ora imperialista (tendendo para os britânicos), ora pró-independência
(tendendo para os árabes). Esse conflito interno, que baliza a construção do
personagem, chega ao espectador (em imagens) por meio do seu vestuário.
Essa relação conflituosa de um personagem
estrangulado pelas forças políticas que o circundam já havia sido explorada por
Elia Kazan no ótimo Viva Zapata (1952).
A diferença é que Kazan optou por martirizar seu personagem, exemplo maior de
caráter e conduta, interpretado por Marlon Brando. Seu filme é mais
panfletário, esquerdista até, expediente pelo qual ele teve de responder
posteriormente quando intimado a prestar esclarecimentos no Comitê de
Investigações de Atividades Anti-Americanas. Kazan ainda insistiria nessa
abordagem manipulativa de um personagem em Um
Rosto na Multidão (1957), num contexto midiático pleno e de exposição
danosa (os primórdios da televisão e da exploração da imagem).
Todos os três filmes mencionados retratam
figuras que, de uma forma ou de outra e envolvendo graus distintos de
influência e caráter, operam como marionetes (puppets) num cenário político de interesses bem mais amplo/complexo
do que eles são capazes de enxergar. O custo pessoal da empreitada é alto,
talvez além do que eles estariam dispostos a arcar se soubessem dos sacrifícios
a que seriam submetidos, fossem eles físicos ou morais.
E examinando-lhes a vida e as ações, conclui-se que eles não receberam da fortuna mais do que a ocasião de poder amoldar as coisas como melhor lhe aprouveram. Sem aquela ocasião, suas qualidades pessoais se teriam apagado e sem essas virtudes a ocasião lhes teria sido vã.
O Príncipe, Nicolau Maquiavel