domingo, junho 28, 2015

Uma Noite de Aventuras (Chris Columbus, 1987)


Eu não me lembrava dessa estréia de Chris Columbus. Ele trabalha a premissa clássica dos personagens que se perdem numa jornada noturna, conduzida aqui numa chave cômico-infantil (especialidade do diretor), cujos desdobramentos já haviam sido explorados em outros gêneros com maior ênfase no aspecto psicológico dos tipos envolvidos. O resultado fica mais próximo das comédias físicas de outrora, com uma pitada leve e divertida do choque de classes, numa abordagem relativamente ingênua da questão, sem necessariamente trair o "retrato açucarado da realidade" que o filme procura explorar (à maneira das screwball comedies dos anos 1930). O enredo enfileira uma aventura atrás da outra, todas inusitadas, com personagens saídos de um digno cartoon urbano (resultando na parte cômica da empreitada), com caracterizações bem acentuadas dos tipos retratados.

Chris Columbus entrega um produto típico dos anos 1980, mais inofensivo do que as memoráveis investidas de John Hughes no formato, quando o adolescente passou a ser explorado pelo mercado de consumo, consolidando-se como a bola da vez. O dilema sexual dos jovens, carro chefe dos filmes desse período, está presente numa roupagem mais atenuada, de forma a não comprometer o espírito familiar da produção (a classificação etária é livre).

O filme segue um crescendo até a metade da projeção, quando a babá (Elisabeth Shue) e os adolescentes sob sua guarda se refugiam no palco de uma casa de blues de Chicago, sob os olhares de desaprovação da plateia formada exclusivamente por negros. A saída proposta pelo bluesman Albert Collins é um canção interpretada pelos "convidados brancos", que retrata de forma bem humorada os infortúnios que os levaram àquele mal entendido. Simplesmente a melhor cena do filme. Daí em diante, infelizmente, o roteiro não segura a mesma imprevisibilidade do início, embora isso não comprometa o restante da jornada.

quinta-feira, junho 18, 2015

Os Caçadores da Arca Perdida (Steven Spielberg, 1981)


Perdi as contas de quantas vezes vi os Caçadores. Todas em Telas Quentes, SuperCines e Sessões da Tarde da Rede Globo em versões dubladas e na janela 1.37:1, além das gravações em VHS (como o filme era exibido frequentemente, dava para manter as gravações num nível bacana de qualidade, já que o conteúdo deteriorava se fosse muito acessado). Esse é o típico filme descoberto no final da infância/início da pré-adolescência, que desperta a vontade incontrolável de se ver inúmeras vezes sem prejuízo algum para a aura que envolve o seu encanto. Depois vieram as continuações, no mesmo patamar de qualidade do original, capazes de alternar constantemente o meu ranking pessoal de preferência (Indiana Jones e a Última Cruzada foi o único visto no cinema).

A sessão do Cinemark serviu para colocar a minha relação com o filme em perspectiva, uma vez que a experiência de vê-lo havia sido anterior ao período em que a cinefilia amadureceu na minha vida.

- é impressionante o cuidado que Spielberg demonstra com a apresentação do personagem logo na primeira cena do filme (desde os créditos de abertura até a fuga de Indiana Jones em um avião monomotor). Ele administra o tempo de forma magistral, alternando momentos de suspense (susto) e humor, de pausa (reflexão) e aceleração (ação), definindo o ritmo que irá perdurar por toda a projeção. Alfred Molina tem uma participação curta, porém memorável. Harrison Ford conquista o espectador com um charme irresistível, pautado exclusivamente na expressão corporal, num raro equilíbrio entre a fragilidade e o excesso de auto confiança;

- o filme é muito mais infantil do que aparenta, embora os personagens se esforcem para não demonstrá-lo. O diretor encontra o equilíbrio entre a fantasia e a realidade, conduzindo o enredo sem se levar muito a sério (o personagem de Indiana Jones e a interpretação de Harrison Ford balizam essa percepção). Mesmo emoldurado num formato que dificulta o destaque da expressão pessoal, Spielberg encontra espaço para exercer suas obsessões e projetar seu universo sobre o material (a Arca Perdida do título teria sido a melhor “arma judia” empregada para combater os nazistas nefastos, um verdadeiro instrumento de extermínio do mal). Quentin Tarantino levaria essa "expressão autoral" às últimas consequências, valendo-se do próprio cinema (no caso, o material inflamável do qual os negativos eram feitos) para dar cabo dos nazistas em Bastardos Inglórios (2009);

- a única cena íntima entre Harrison Ford e Karen Allen é um deleite visual puro, que dá conta de conjugar romance, aventura e humor no mesmo pacote, sem trair o espírito de leveza de toda a empreitada (é importante lembrar que a produção tem classificação livre). A sensação de que estamos sendo trapaceados pela esperteza do diretor é constante, mas mesmo diante dessa constatação, que normalmente causa um distanciamento da proposta, neste caso nos impulsiona com mais força para a sua aceitação.