Eu não sei por quanto tempo o impacto de A Chegada vai permanecer comigo, mas
torço para que seja duradouro. Assim como outros filmes do mesmo diretor Denis
Villeneuve (Incêndios, Suspeitos e Sicário), este também tem o mérito de
sustentar um suspense intrigante na primeira parte, de caráter mais mundano,
envolvendo impactos bastante abrangentes, até que o drama pessoal do(a)
protagonista começa a se fundir ao escopo mais amplo do roteiro. Seus filmes
exploram questões que nos dizem respeito a todos, a violência/truculência/guerra
se manifesta sempre de alguma forma no fluxo inexorável da narrativa, dividindo
espaço com as angústias/inseguranças/ incertezas do(a) protagonista em um nível mais íntimo.
Parte-se da humanidade,
da população, da sociedade para se atingir o drama do indivíduo (o todo pela
parte).
Não tenho dúvidas de que esse seja o seu projeto mais ambicioso, porque a conexão da parte com o todo se faz num
grau mais rarefeito, quase abstrato, numa narrativa que explora uma relação
arriscada entre uma "invasão" alienígena e uma mulher sensível, especialista
em linguagem e comunicação, que ainda não se recuperou da perda da sua filha.
Spielberg conseguiu algo parecido em Contatos
Imediatos do Terceiro Grau (1977), que, coincidentemente, considero o seu
melhor filme - é interessante observar a diferença de abordagem entre os dois
cineastas, em que a influência infantil de Spielberg fica mais evidente
(presente em boa parte da sua filmografia), sem que isso represente qualquer
juízo de valor, não passando de uma mera constatação.
Tanto lá quanto aqui, a comunicação é o
cerne da questão, não apenas a tentativa de comunicação praticada entre os
humanos e os extraterrestres, mas, sobretudo, aquela praticada entre os
próprios seres humanos (a primeira servindo de metáfora para a segunda).
Enquanto eu via o filme, ou mesmo após o seu término, Gravidade (Alfonso Cuarón, 2013) e Interestelar (Christopher Nolan, 2014) me pareceram influências
mais óbvias. Mas agora que raciocino a respeito dele para escrever essas
linhas, Contatos Imediatos me parece
uma comparação mais justa, certo de que minha memória não está me traindo.
O
filme explora a nossa incapacidade de se comunicar, de se entender, que não
raro culmina na ruína das nossas relações, bem representada pela afobada
intervenção das forças armadas, recorrendo ao aparato bélico para dizer a que
veio (a sequência que estabelece essa decisão gera uma discussão interessante,
quando a diferença entre "weapon" e "tool" instaura um
ambiente inseguro em que pairam apenas incertezas e medo). Mas ele não fica
restrito a essa esfera. No nível mais íntimo, pessoal, o filme explora o poder
imensurável do afeto, da aproximação, do toque, culminando num abraço de
redenção absoluta, dos personagens e do público, carregado de energia e emoção.
Terminada a sessão, eu só desejava estar nos braços dos meus filhos e minha
esposa, exaurido pela jornada de desencontros que a heroína Louise Banks (Amy
Adams) acabara de enfrentar. O caminho para o entendimento só encontra espaço
para se manifestar no diálogo, ainda que seja sacrificante para uma ou ambas as
partes.