terça-feira, outubro 06, 2015

Corrente do Mal (David Robert Mitchell, 2014)



Foi ainda na década de 70 que os filmes de terror "descobriram" o público adolescente, explorando a combinação bombástica: sexo + morte. Os anos 80 foram pródigos na exploração desse combo. O cinema empilhava referências que enriqueciam o imaginário popular, com os seus vilões/monstros que se tornaram ícones, difundindo o gênero para uma gama mais ampla de adoradores. Eu mesmo cresci nesse ambiente cultural que foi menosprezado na ocasião e hoje ganha ares de valorização (menos pela relação nostálgica de quem escreve, mais pela tendência corrente de explicitar o que antes era apenas sugerido).

David Robert Mitchell bebe nessa fonte para construir o excelente Corrente do Mal (It Follows). Sua referência explícita é o formato que consagrou o diretor John Carpenter, com o uso das lentes panorâmicas e o subúrbio americano em Halloween (1978), principalmente, e Christine, O Carro Assassino (1983), secundariamente.

Em Halloween, o assassino Michael Myers divide o protagonismo do filme com a mocinha (Jamie Lee Curtis). A sua presença é tão marcante (beirando o extremo de ser quase sedutora) que o espectador experimenta um misto de medo e identificação, a ponto de torcer pelo êxito da sua empreitada (ou, ao menos, pelo seu aparecimento, que é a razão de ser do filme). David Robert Mitchell cria um assassino/perseguidor não identificável, praticamente abstrato, decorrente da prática sexual (recorrendo a combinação de medo e desejo). No limite da sua proposta, o vilão/assassino/perseguidor/monstro pode ser qualquer pessoa que se aproxime da vítima. Ainda, aproveitando outra referência do gênero, A Noite dos Mortos Vivos (1968), de George Romero, essa coisa (o "It" do título original), bem como os zumbis do clássico, apenas caminha, não corre, sobrando tempo para a vítima escapar, o que contribui para alongar a tensão da cena.

Em pouco mais de quinze minutos o espectador já se encontra familiarizado com a trama e o fluxo de "contaminação" que orienta a propagação desse mal. Uma vez "infectada", a vítima só se livra dessa condição fazendo sexo com outra pessoa. A combinação entre sexo e morte é levada ao extremo, em pleno acordo com as convenções do gênero.

O roteiro flerta com uma saída redentora, no cerne dessa "brincadeira macabra", que poderia soar bastante piegas não fosse a habilidade do diretor de conduzir a situação sem forçar demais a barra. A protagonista se depara com o "mal" numa noite de aventura com um sujeito boa pinta que transita fora da sua esfera de influência (aquele tipo desejado por todas as garotas da escola). Um dos seus amigos, que nutre por ela uma atração (sugerida apenas pela troca de olhares captada pela câmera), se sujeita a libertá-la dessa condição mas não vê correspondência nas suas insinuações. O sexo com esse amigo, caracterizado como um nerd, não oferece perigo, já que o desejo acaba por ficar de fora da equação. Seu sacrifício, e o desfecho do filme, reservam um dos grandes anticlímaxes do cinema de massa contemporâneo. A cena da piscina de quebra me trouxe a boa lembrança do Deixa Ela Entrar (2008), de Tomas Alfredson.

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