terça-feira, fevereiro 28, 2017

I Am Not a Serial Killer (Billy O´Brien, 2016)





Como o post anterior começou a ficar muito longo, achei melhor dividi-lo. I Am Not a Serial Killer foi a outra boa surpresa que assisti recentemente, constante na lista de melhores de 2016 do Filipe Furtado. O filme se encontra listado na Netflix, mas dificilmente eu o teria selecionado sem uma indicação previa. A lista de prioridades é tão ampla que não arrisco fazer uma escolha sem critérios.

Outra produção que parece ter saído do túnel do tempo dos anos 80 - pra quem gostou da série Stranger Things é um prato cheio. Já começa nos créditos de abertura sobrepostos às imagens captadas com um ar bem retrô de produção barata: uma fonte vermelho vivo contrastante com a monotonia monocromática de uma cidade interiorana levando a vida entre o outono e o inverno rigorosos.

O personagem principal, interpretado por Max Records, sustenta o interesse do público por toda a metragem do filme: um adolescente órfão de pai, criado pela tia e pela mãe, cuja única fonte de renda advém das autópsias dos defuntos da pequena cidade. O filho se recolhe em seu mundo, manifestando algumas atitudes depressivas com tendências suicidas, o que lhe garante um acompanhamento contínuo de um terapeuta especializado. A mãe se esforça para se aproximar do jovem, até mesmo fazendo-o participar das sessões de autópsia, mas não vê suas investidas avançarem rumo a um entendimento. O jovem incorpora todo o clichê do adolescente rejeitado: sofre bullying na escola, afasta seu interesse romântico mesmo quando tem a intenção de se aproximar, não tem amigos, etc. Dito assim, parece que o filme será uma fossa sem fim, de forma que a depressão abordada contagiará o público.

O que confere vida a essa cidade interiorana e a esse personagem mal interpretado é a mais improvável das circunstâncias: um serial killer que anda fazendo vítimas na comunidade, amedrontando seus cidadãos, sem que a polícia consiga identificar a sua identidade. O jovem, que além de depressivo é diagnosticado com um perfil de serial killer, assume informalmente a investigação do caso com desdobramentos para lá de inusitados.

Essa bizarra conexão entre o adolescente e o serial killer mantém o interesse do público aceso até o último plano. À medida que o adolescente vai se tornando mais enigmático perante o público, seu círculo de convivência vai se estreitando, forçando-o cada vez mais ao isolamento. Não tem como antecipar o seu desfecho, caloroso e chocante ao mesmo tempo. Christopher Lloyd e Max Records nasceram para desempenhar esses papéis.

O Hóspede (Adam Wingard, 2014)




As últimas três semanas me proporcionaram experiências cinematográficas bastante ricas. Faz algum tempo que não tenho selecionado qualquer filme do meu arsenal "alternativo" à disposição, orientando minhas escolhas basicamente pelas programações correntes da Netflix e da Net (Now). Mesmo com a oportunidade de encaixar algumas sessões de cinema nesse período, com Elle (2016, Paul Verhoeven) e John Wick 2 (2017, Chad Stahelski) em sequência, não será deles que escreverei nas próximas linhas. Os dois filmes que justificaram este post foram O Hóspede (2014, Adam Wingard) e I Am Not a Serial Killer (2016, Billy O' Brien), o primeiro na Net e o segundo na Netflix.

De Wingard eu conhecia apenas o terror cult, ainda presente na Netflix, You're Next (2011). O blog do Ronald Perrone, Dementia 13, relacionou o filme em alguma das suas inúmeras listas, me fazendo o imenso favor de apresentá-lo. Se a memória não me falha, Perrone tentava eleger os melhores filmes de terror a partir dos anos 2000, logo após o lançamento de A Bruxa (2015, Robert Eggers) no início do ano passado. Dessa lista passei a conhecer Adam Wingard e Jim Mickle, tendo assistido até agora dois filmes de cada. A refilmagem de A Bruxa de Blair, inclusive, ficou a cargo de Adam Wingard, gerando bastante expectativa, porém resultando numa experiência não muito empolgante (ainda não o vi, mas devo fazê-lo).

O Hóspede é um filme de suspense muito bem construído, daqueles em que o espectador torce pelo bandido, tamanho o fascínio que o personagem/ator exerce no seu imaginário. O carisma do ator Dan Stevens, que eu desconhecia completamente, é fundamental para sustentar essa condição. Em dez minutos de projeção o diretor e roteirista Adam Wingard apresenta o personagem e estabelece o tom sombrio que vai perdurar nas próximas duas horas. São poucas tomadas curtas carregadas de atmosfera - o filme se passa durante a celebração do Halloween. A estratégia adotada pelo realizador é abusar do apelo sedutor de Dan Stevens e garantir a sua conexão emocional junto ao público. Aos poucos a psique do personagem vai sendo revelada ao espectador, que passa a experimentar um sentimento de repulsa e aproximação ao mesmo tempo. O personagem carrega uma sequela devido à sua passagem pelo exército que poderia servir de "mensagem política do filme", mas é habilmente evitada pelo diretor.

O desfecho se passa todo num imóvel que está sendo preparado para abrigar a festa de Halloween da cidade, cuja decoração carrega todo o aparato característico que compõe o seu material visual. Todo esse entorno contribui para valorizar a encenação e ampliar o clima de suspense pretendido. A atriz principal Maika Monroe emplacou no mesmo ano o sucesso Corrente do Mal (2014, David Robert Mitchell), tornando-se da noite para o dia a atual musa dos filmes de terror norte americanos.