segunda-feira, junho 18, 2012

Baile Perfumado (Paulo Caldas e Lírio Ferreira, 1997)




Em primeiro lugar, é preciso que seja simpático, porque é necessário pedir favores e fazer com que 20 pessoas aceitem trabalhar de graça para filmar seu primeiro curta-metragem. Depois, é preciso convencer os que vão pagar os negativos. Ele deve ser simpático, otimista e, se for sexy, melhor ainda. Para realizar um segundo curta-metragem deve ser persistente, cínico, atrevido e frequentar uma academia, porque nesse meio tempo também envelheceu. Deve ser maquiavélico porque, da segunda vez, é preciso enganar a pessoa que se deixou seduzir na primeira.
Pedro Almodóvar

De todas as abordagens possíveis que cercaram o encontro do fotógrafo libanês Benjamin Abrahão (Duda Mamberti) e o cangaceiro Virgulino Ferreira da Silva, vulgo Lampião (Luiz Carlos Vasconcelos), Baile Perfumado (1997), de Paulo Caldas e Lírio Ferreira, adotou a mais inventiva, crítica e bem humorada delas. A dupla evita as facilidades da empreitada, distanciando-se do tom documental inerente à proposta, reinventado de forma criativa e fantasiosa o que teria sido esse registro histórico iconográfico. A licença um tanto poética com que eles se debruçam sobre o material lhes permite numa só tacada fazer uma reflexão sagaz, madura e atemporal acerca do mítico Sertão Nordestino e da própria condição “maldita” de cineasta (nordestino, mais especificamente).

Desde a primeira vez que eu li o trecho que abre esse post na introdução do livro Conversas com Almodóvar, de Frederic Strauss, aguardo o momento oportuno para utilizá-lo em um dos meus textos, tamanha a franqueza provocativa com que assunto é tratado – trata-se da resposta à pergunta “Que conselhos daria hoje a alguém que queira se tornar cineasta?”, levantada pelos espectadores que compareceram em massa a um debate especial organizado pela revista Cahiers du Cinema durante o Festival de Paris, em 1998. Antes mesmo do término de Baile Perfumado já era evidente que essa seria a ocasião perfeita para tal. O périplo de Benjamin Abrahão pelo sertão nordestino em busca da imagem definitiva de Lampião, nas mãos dos dois cineastas, serve de metáfora para o registro criativo das adversidades que configuram a essência dessa profissão tão nobre quanto ingrata. Mal sabe Almodóvar que o fardo que ele carrega pra preservar a sua condição de cineasta é leve comparado aos lampiões, milícia, governo, coronéis, igreja e imprensa que o sertanejo tem que engabelar para resguardar o seu minguado sustento.

Mesmo quando visto fora do contexto da ocasião em que foi filmado – em 1997 o país ainda retomava aos trancos e barrancos o seu ritmo de produção depois de ter quase chegado à estaca zero dentro de seu próprio mercado, em virtude da extinção da Embrafilme pelo governo de Fernando Collor de Mello em 1989 –, o seu frescor ainda permanece intacto. Indício de que o filme resistiu à prova do tempo. Duas coisas na produção me chamam muito a atenção: 1. a interpretação inspiradíssima de Duda Mamberti num registro antológico de Benjamin Abrahão (com sotaque impagável) e 2. as imagens de Lampião na Serra Talhada ao som de Chico Science e Lúcio Maia. Filmaço.

5 comentários:

  1. Amo esse filme. Já o vi umas três vezes. Creio que foi a melhor abordagem do cangaço no cinema.

    O Falcão Maltês

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    1. Embora eu não conheça tão bem outros registros, tendo a concordar com você, Nahud. Pelo menos, ele se tornou a minha referência do cangaço.

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  2. Rodrigo, meu caro, sou do cuso de História da UFS e estou elaborando uma monografia sobre este filme. E gostaria de saber onde eu encontro o roteiro dste filme? Seria muito grato com alguma resposta..

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    1. Allan, eu gostaria muito de poder ajudá-lo. Infelizmente, não sei aonde encontrar esse roteiro precioso. O filme nem conta com uma cópia em DVD ou VHS disponível (pelo que me consta). Não fosse o Canal Brasil, eu ainda não o teria visto. Embora seja muito trabalhoso, caso você disponha de uma cópia, sugiro que transcreva os diálogos. Não vejo outra forma de conseguir o que procura. Feliz Ano Novo e boa sorte!

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  3. Na verdade a melhor forma de conseguir este roteiro seria através de contato (email, por exemplo) com os roteiristas e diretores do filme, mas é muito difícil de encontrar. Feliz Ano Novo pra você também e obrigado pela rápida resposta.

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