quinta-feira, abril 25, 2013

Luz nas Trevas e A Busca



Luz nas Trevas

Mais uma vez, não fosse o SESC e seu festival de melhores filmes só o Canal Brasil para resgatar Luz nas TrevasA Volta do Bandido da Luz Vermelha do limbo. Por sorte, o filme foi selecionado para integrar o calendário do evento em Ribeirão Preto, exibindo longas-metragens selecionados do circuito comercial de 2012.

É curioso observar como dois cineastas que fizeram fama nos anos 60, Rogério Sganzerla e José Mojica Marins, a partir de duas figuras icônicas que passaram a integrar o imaginário nacional, Bandido da Luz Vermelha e Zé do Caixão, respectivamente, adotaram praticamente a mesma via para ressuscitar seus personagens um pouco mais de 30 anos depois deles despontarem nas telas. O bandido voltou pelas mãos da esposa do falecido Rogério Sganzerla, Helena Ignez, dividindo a direção com Ícaro Martins Jr. em Luz das Trevas (2010), e Zé do Caixão reencarnou na pele do próprio Mojica Marins, sob a sua supervisão em Encarnação do Demônio (2008). A bela fotografia de José Roberto Eliezer reforça as semelhanças entre os filmes. Embora a produção de Luz nas Trevas seja posterior ao falecimento de Sganzerla, o roteiro é de sua autoria.

As primeiras imagens dos dois filmes dedicam-se a estabelecer o paradeiro de seus (anti) heróis: ambos estão encarcerados em presídios de segurança máxima, afastados das transformações pelas quais o país foi submetido (ou submeteu-se?) nas últimas quatro décadas. O Brasil já é outro, mas ainda é o mesmo. A partir do mesmo rol enxuto de personagens, centrado nas figuras cartunescas de autoridades, como a polícia e os políticos, os cineastas pintam o Brasil com as cores da violência e da corrupção, sob um verniz deliberadamente debochado. Como bem pontuou José Geraldo Couto em seu texto de 28/09/10, Luz nas Trevas do cinema, “o que era paródico no primeiro Bandido ganha um grau a mais de ironia e derrisão”. Antes havia a ditadura pra chancelar essas práticas, agora...

Ainda que o bandido, surpreendentemente interpretado por Ney Matogrosso, permaneça quase todo o filme atrás das grades, Sganzerla tira da cartola um filho bastardo, o assaltante Tudo ou Nada, que se esforça para seguir os passos de outrora do pai. Em liberdade, ele se alia a edição mais nova da antiga anti-heroína Janete Jane, interpretada pela filha de Helena Ignez e Rogério, Djin Sganzerla, e explora essa condição até as últimas consequências. A tragédia caminha de mãos dadas com a dupla de transgressores, fortemente influenciada pelo par Jean-Paul Belmondo e Anna Karina de O Demônio das Onze Horas (Jean-Luc Godard, 1965) – o original já trazia essa referência.

Como já se passara com O Bandido da Luz Vermelha, é a forma que confere à Luz nas Trevas o caráter libertário, jovial, fluente, pulsante, vívido que o caracteriza, capaz de seduzir os espectadores iniciados com a mesma contundência que o mais tarimbado dos cinéfilos. De José Geraldo Couto vem outra bela passagem, ao registrar a forte presença de Sganzerla em cada plano de Luz nas Trevas, “em especial nas perseguições, filmadas com a câmera acoplada à lateral do automóvel em ligeiro contra-plongé, em cada linha de diálogo, em cada nota da trilha sonora (brilhantemente organizada por sua outra filha, Sinai Sganzerla, com trechos de Jimi Hendrix, Jorge Benjor, Gil, ópera, samba, bolero). Está presente sobretudo no uso da luz não para revelar uma imagem dada, mas para criá-la; no uso do som como contraponto transformador da luz; no uso da montagem como dispositivo multiplicador de sentidos.”



A Busca

Depois de tanto estardalhaço que se fez na comparação do cinema brasileiro com o argentino, prevalecendo nas avaliações a qualidade do segundo sobre o primeiro, parece que finalmente foi produzido um exemplar nacional com a cara de produto argentino. Antes que eu seja mal interpretado, deixe-me esclarecer um ponto: eu sempre achei essa “rixa” totalmente improdutiva, mais apropriada para lidar com as divergências futebolísticas do que artísticas, com efeitos mais deletérios do que propriamente vantajosos para os problemas enfrentados pela produção nacional. E, por mais que os hermanos tenham emplacado uma sequência de filmes merecedora de atenção (sobretudo no início da década de 2000), os bons fluidos já não reverberam com a mesma intensidade.

Não é difícil desqualificar o filme, que se ancora em seu talismã, Wagner Moura, o nosso Ricardo Darín, pra fazer algumas cenas funcionarem na marra. Entre trancos e barrancos, elas acabam funcionando. Desconfio que se eu não estivesse vivenciando o processo de paternidade neste momento, minha tolerância para os “defeitos” do filme teria sido infinitamente menor.

A crítica do Filipe Furtado para a Revista Cinética dá conta do recado.

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