segunda-feira, junho 03, 2013

Vocês Ainda Não Viram Nada (Alain Resnais, 2012)


Outra peça teatral adaptada para o cinema com o toque inconfundível de Alain Resnais – nesse caso, a rigor, são duas peças do dramaturgo Jean Anouilh, Eurídice e Cher Antoine ou L´Amour Raté, sendo a primeira encenada sobre a estrutura dramática da segunda, uma dentro da outra. As preocupações acerca do tempo e da memória, realidade e sonho (fantasia), estão, com de hábito, perfeitamente combinadas, valorizadas pelo dinamismo da montagem - que agora conta com um recurso até então menosprezado pelo diretor: a tecnologia, na forma do CGI. Essa marca registrada do diretor, que permeia toda a sua obra e lhe valeu por algum tempo a alcunha de realizador de produções “difíceis”, é totalmente despojada em Vocês Ainda Não Viram Nada: desde os créditos de abertura, em que os atores (famosos do cinema francês) são convocados por seus verdadeiros nomes em um telefonema para uma sessão póstuma de Eurídice, o espectador já se vê como cúmplice do jogo de encenação que se seguirá até o término do filme. Resnais não sonega nenhuma informação que possa nos privar de alguma referência. Mesmo jogando limpo com o espectador desde o início, o que pode ser considerado uma característica incomum em sua filmografia, o encanto da experiência permanece absolutamente intacto.

O nítido prazer dos atores ao reencenar os papéis da dita peça que em outros tempos já foram seus, só vem a reforçar o clima de festa e descontração que parece dominar as últimas produções de Resnais. Um famoso trailer de Bastardos Inglórios (2009) que circula pela internet mostra o radiante diretor Quentin Tarantino repetindo uma tomada depois de uma provável jornada exaustiva, ao que ele mesmo pergunta à produção, “Cool! Still one more time... Why? Because we love making movies”. Esse parece ser o ímpeto que vigora nas produções de Resnais também. Esse contentamento e satisfação pela filmagem (tournage), pela engrenagem do processo, contagia o espectador, transparecendo no resultado final. Quando a encenação de Eurídice termina e os atores se congratulam a lembrança de Noite de Estreia (1977), de John Cassavetes, foi inevitável, ao que o próprio e sua esposa, na ficção e na vida real, Gena Rowlands, descem do palco para serem ovacionados pelos seus pares.

Talvez o único cineasta capaz de fazer frente à Resnais hoje em dia seja Manoel de Oliveira. Mesmo gozando de idade avançada, suas produções emanam energia - e olha que elas lidam de frente com o fim que se avizinha.

O que eu vi de melhor no ano até agora.

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