Lamento não ter assistido ao Tabu (1931) de F.W. Murnau antes do Tabu (2012)
de Miguel Gomes. Pela breve descrição da trama encontrada em alguns dos User Reviews do site IMDB é certo que a
semelhança entre os dois filmes vai muito além do título. Caso eu o tivesse
visto, provavelmente a minha experiência teria sido enriquecida uma vez que eu
teria outro (excelente e fundamental) parâmetro para construir a minha
percepção. Parece-me que a influência de Murnau extrapola a esfera do título e
da trama, manifestando-se, sobretudo, na forma.
Sempre que penso na discussão da
forma no cinema me lembro dos anos em que meu interesse pelos filmes extrapolou
o âmbito das imagens e foi de encontro ao papel desempenhado pela crítica. Meu
gosto pela leitura surgiu nessa época, estimulado pelas questões que só um
texto bem redigido é capaz de levantar. Como era de se esperar, a minha relação
com a sétima arte só veio a se aprofundar a partir dessa ocasião. Confesso que
levei um bom tempo para compreender a razão pela qual a forma era mais
celebrada do que o conteúdo. Depois que a ficha caiu, um novo horizonte se
abriu trazendo consigo um grau de amadurecimento nem sempre desejado, que se manifestava sempre que o novo discernimento se dispunha a expor as engrenagens dessa
enganosa fábrica planejada de sonhos e fantasias - só os bons diretores fazem
bom uso desse recurso, que nada mais é do que a manipulação pura e simplesmente.
Depois dessa breve introdução,
necessária para o desenvolvimento do raciocínio, vamos ao que interessa. O Tabu de Miguel Gomes serve como um bom
exemplo que pode ser muito bem empregado sempre que a discussão forma/conteúdo
vem à tona. O que faz essa produção pairar sobre outras que também se prestam a
fazer um relato de uma aventura amorosa num tempo remoto é justamente a forma
adotada por seu diretor para conduzir essa história banal. Do ponto de vista do
conteúdo ela tem pouco a acrescentar ao provável universo de experiências do espectador,
mesmo quando se pensa em iniciados. O uso do preto e branco, da janela (aspect ratio) 1.33:1 e do mudo talvez
sejam os aspectos mais óbvios, ainda que extremamente necessários e pertinentes,
a justificar esse argumento, sendo os dois primeiros responsáveis pela “cara”
do filme. A memória e a lembrança, fundamentais na segunda parte, materializam-se
perfeitamente no tom acinzentado da fotografia, bem como na corajosa decisão de
subtrair o som dos diálogos dos personagens – assim como se dá com os nossos
sonhos! A narração melancólica e pausada do próprio Gomes infunde um ar saudosista
ao relato, radiofônico, reforçado pelas intermitentes apresentações do grupo
musical (anacrônicas, mas não menos que inspiradas). Esse conjunto de decisões é
tão bem costurado pelo diretor que funciona maravilhosamente bem.
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