quarta-feira, fevereiro 29, 2012

A Invenção de Hugo Cabret (Martin Scorsese, 2011)



Movies touch our heart, and awakens our vision, and change the way we see things. They take us to other places. They open doors and minds. Movies are the memories of our lifetime. We need to keep them alive.
Martin Scorsese

Confesso que tenho uma queda por filmes que exploram o universo cinematográfico, seja na forma de um personagem que trabalha na indústria do cinema – 8 ½ (1963), de Federico Fellini, como o exemplo máximo dessa vertente -, ou no retrato dos bastidores de uma gravação – algumas das produções de Howard Hawks são perfeitas nesse sentido, sobretudo Hatari! (1962). Sendo assim, não é de espantar que eu tenha me encantado muito com A Invenção de Hugo Cabret - mesmo que tenha sido apenas num primeiro momento, com a memória fresca pela experiência. A maior virtude de Martin Scorsese foi conseguir transformar a sua própria luta pela preservação da memória - no caso, a memória de Georges Meliès, responsável por Viagem à Lua (1902) - em objeto fílmico. Ele trouxe para o primeiro plano de seu filme uma guerra que ele vem travando há tempos no segundo plano da indústria cinematográfica.

Não fosse por essa obsessão (Scorsese até preside o Film FoundationFilmmakers for Film Preservation), sua carreira, que há tempos se encontra aprisionada ao fascínio das suas primeiras produções, estaria no limbo – tem um exagero nesta afirmação, eu concordo, contudo ela não está totalmente desprovida de razão. Seus últimos projetos, especialmente os realizados depois dos anos 2000, carecem da crueza e secura que caracterizaram sua descida ao inferno nos anos 70, como Caminhos Perigosos (1973) e Taxi Driver (1976), só pra ficar nos exemplos mais óbvios. Sua trajetória como auter se alterna, basicamente, entre o retrato das ruas e seus tipos, as imersões religiosas e a cinefilia (refilmagens, continuações, documentários, exercícios de estilo e parcerias – Paul Schrader e Nicholas Pileggi entre outros). Suas recentes produções com Leonardo Di Caprio transitam por uma zona mal definida, meio amorfa: ora retratam as ruas, ora funcionam como meros exercícios de estilo. Todas elas revelam um Scorsese já devidamente cooptado pelo mainstream, tentando encontrar (ou melhor, manter) seu status de cineasta de prestígio.

Passados uns quinze dias da minha sessão de Hugo, parte do encanto se esvaiu, enfraqueceu, embora a experiência proporcionada pelo 3D tenha sido a mais apropriada que vi até agora, desconsiderando-se Avatar (2010), de James Cameron. Algumas partes ainda permanecem fortes, como o magnífico plano-sequência de abertura, as complexas engrenagens do relógio da estação, a cena dos story boards voando pelos ares e todo o entrecho do modus operandi de Meliès. O que me aproxima definitivamente da proposta do filme e me apanha no contrapé (do ponto de vista emocional) é o carinho com que Scorsese trata a cinefilia - a característica mais presente em todas as suas produções, talvez aquela que ele nunca abandonou. Só me pergunto se o filme desperta o mesmo efeito nos iniciados e/ou menos interessados.

Sem deixar de lado o campo da cinefilia e da homenagem, ainda prefiro o retrato mais nervoso, cru e doentio de Ilha do Medo (2010). Talvez seja o mais radical dos projetos recentes de Scorsese, cujo personagem mais se assemelha à figura do seu criador (ego): enquanto o mundo desmorona a sua volta, o protagonista briga pra permanecer seguro de si e de suas “verdades”.

Dito assim parece até que não gostei do filme, o que não é verdade. Neste momento, travo uma briga interna com meu inconsciente para evitar destratá-lo. A minha intenção é buscar o encantamento que experimentei quando deixei a sala de cinema.

2 comentários:

  1. Respostas
    1. É uma pena Nahud, eu tenho me esforçado para reconsiderá-lo (ou melhor, considerá-lo mais) mas não está fácil. Eu gostei, mas gostaria de dizer isso com mais empolgação.

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