quarta-feira, setembro 07, 2011

Ex-Isto (Cao Guimarães, 2010)





Fiquei curioso para ler o livro Catatau, de Paulo Leminski (1944-89), que serviu de base para a realização do filme Ex-Isto (2010), de Cao Guimarães. Embora eu saiba que não se trata de uma adaptação convencional, o genial ponto de partida da empreitada se encontra todo lá: uma viagem imaginária do filósofo racionalista francês René Descartes (interpretado brilhantemente por João Miguel) ao Brasil, desembarcando como membro da comitiva do holandês Maurício de Nassau (1604-1679) na ocupação de Pernambuco. Desse mote interessantíssimo Cao Guimarães extraiu um filme sensorial, exuberante, quase tátil, repleto de cores, sons e “cheiros”. Uma verdadeira viagem pelo Brasil das contradições, dos paradoxos, da riqueza natural e do povo resignado, que mesmo diante dos infortúnios encontra alegria onde prevalece a miséria.

João Miguel começa bem vestido, carregado de trajes de época dignos de um mosqueteiro e aos poucos vai se despindo, peça por peça, culminando num banho de mar totalmente nu - reflexo do calor tropical insuportável e da necessidade do filósofo de se aproximar/tocar/sentir nossa exuberância: água, terra e ar. São dois extremos bem captados por Cao Guimarães: no início bem trajado, fotografado no segundo andar de uma biblioteca, “engolido” pela quantidade de livros que o circundam; no final despido, fotografado em uma praia do nosso extenso litoral, banhado pela areia, o sol e as águas do mar. O desempenho mudo de João Miguel é a alma do filme, no estilo “estou, logo existo”. O voice-over representa seu fluxo de consciência e justifica a célebre frase “penso, logo existo”. Ótimo filme. 

5 comentários:

  1. Um dos piores filmes que já tive o desprazer de assistir.
    O mundo é algo ordenado e com lógica e a mente humana é capaz de compreender o mundo que o cerca. Não entendo esse filmeco,que busca algo onirico, uma história sem sentido, tentando atacar a razão humana e a capacidade de compreender o mundo. O filme mostra a pobreza mental de Leminski e Cao Guimarães. O romance nonsense de Leminski e o filme nonsense do Cao Guimarães são ridiculos, tentando negar o que distingui o homem dos demais seres vivos. Não tem sentido o proposito do filme? Qual seria? Negar a racionalidade humana?
    Não comparo esse filme a obra-prima de Rosselini sobre Descartes, tratando de aspectos relevantes da vida dele e sua filosofia. A idéia de tratar com profundidade o tema em vez de se entregar a fantasias tolas separa um cineasta como Rosselini de um Charlatão como Cao Guimarães.

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    1. Eu acho essa comparação meio desonesta. Embora o personagem retratado nos dois filmes seja o mesmo, o ponto de partida de cada um deles é muito distinto um do outro: Rossellini tenta criar uma "biografia" do retratado, Cao Guimarães trabalha uma hipótese/suposição/"E se..." que mesmo sendo absurda não deixa de ser interessante. Concordo que exige um esforço por parte de quem assiste para entrar no jogo proposto. Não diria que se trata de um filme que me dá prazer de assistir, mas embarquei na proposta.

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  2. È exatamente essa necessidade arrogante de se distinguir dos outros seres vivos que torna o homem chato, e claro, arrogante. Porque queremos nos distinguir do resto da natureza, se nós tambem somos natureza? E que capacidade manca é essa que temos de compreender o mundo, já que precisamos nos distinguir. Acho que a própria necessidade de se separar dos outros revela a nossa rasa capacidade de compreensão.

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    1. Maria Joana, você levantou uma questão interessante, embora eu não acredite que ela represente o cerne das preocupações do autor do livro e do diretor do filme. A sua interpretação caberia perfeitamente num filme do Terrence Malick (A Árvore da Vida), por exemplo. Entendo que em "Ex-Isto" o cineasta procurou estabelecer uma ponte entre a "razão e a sensibilidade" (a frieza teórica e a prática), tomando a Europa medieval, as navegações e o descobrimento como ponto de partida, a fim de refletir/questionar nossas "riquezas naturais e contradições sociais". Desse ponto de vista, acho o filme muito bem sucedido. Muito embora concorde com suas colocações, não as considero apropriadas para o filme em questão.

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