terça-feira, outubro 22, 2013

Stanley Kubrick na 37ª Mostra

Por uma feliz coincidência, o show do Black Sabbath me levou a São Paulo no mesmo final de semana em que a Exposição Stanley Kubrick começava no MIS, juntamente com a exibição de todos os seus filmes em versão restaurada -  incluindo os curtas do início de carreira, exceto o longa de estreia, Medo e Desejo (1953). A curadoria da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, nesta 37ᵃ Edição, decidiu destacar o trabalho do diretor homenageando-o com essa preciosa programação além de promover o lançamento do livro, Conversas com Kubrick, do renomado crítico francês Michel Ciment.

A priori, minha ida a capital estava programada para o fim de semana passado, quando eu já havia negociado com a patroa a minha participação nos dois primeiros dias do aguardado Evento. Acabei sacrificando um pouco mais a paciência dela para estender a minha estadia por mais um final de semana (anterior à abertura), justificado pela oportunidade de assistir em primeira mão alguns dos filmes de Kubrick, sobretudo aquele que me faltava, Barry Lyndon (1975). A intensa procura por ingressos antecipados, contudo, me fez perder a exibição que eu mais ensejava ver, 2001 – Uma Odisséia no Espaço (1968). Para compensar a perda, foi preciso uma sessão seguida de O Estranho Caso de Angélica (2010), de Manoel de Oliveira, e Las Acacias (2011), de Pablo Giorgelli – sorte que a programação da capital me reservou essas duas preciosidades. Ainda rolou o Gravidade (2013), de Alfonso Cuarón, a que devo voltar em outra ocasião – mas já adianto que gostei do filme.

Como a fila para a Exposição estava quilométrica e esta permanece em cartaz até 12 de janeiro de 2014, vou aguardar a poeira baixar para visitá-la (na companhia da esposa, de preferência, para ela entender melhor a razão do favor prestado). Em 2011, essa mesma Exposição estava de passagem por Paris, na Cinemateca Francesa, bem como eu. Visitei-a e prometi que voltaria a ela caso viesse ao Brasil. Pretendo cumprir a promessa. Na época, até postei uma mensagem com as fotos (meia boca) que eu consegui tirar.





Doutor Fantástico (1964)

Dr. Strangelove’s humor is generated by a basic comic principle: people trying to be funny are never as funny as people trying to be serious and failing.
Roger Ebert

Na primeira vez em que eu o vi, em meados da década de 90 (cópia VHS), o impacto proporcionado pelo absurdo da proposta foi tamanho que meu riso mal se manifestava, numa situação típica de quem sente vergonha alheia por um mico que outra pessoa está pagando. Um riso nervoso, cheio de remorso. Eu não estava preparado para ver um assunto sério tratado com tal grau de sarcasmo. Acho que foi a minha primeira experiência com um verdadeiro exemplar da comédia de humor negro. Inesquecível, pra dizer o mínimo. A sessão no MIS me proporcionou uma verdadeira catarse. Dei gargalhadas junto com o público sem nenhum constrangimento. O filme continua afiadíssimo (especialmente no que tange o discurso), repleto de interpretações magistrais. Normalmente, o enfoque das abordagens fica voltado para o desempenho triplo de Peter Sellers e seu memorável Dr. Strangelove - curiosamente, o personagem com o menor tempo de cena. Desta vez, minha atenção ficou toda voltada para George C. Scott e seu General Buck Turgidson, o mais anárquico de todos. Como bem observou Roger Ebert, “Scott´s work is hidden in plain view. His face here is so plastic and mobile it reminds you of Jerry Lewis or Jim Carrey (in completely different kinds of movies). Yet you don´t consciously notice his expressions because Scott sells them with the energy and conviction of his performance. He means what he says so urgently that the expressions accompany his dialogue instead of distracting from it”. Meu Kubrick preferido junto com 2001 – Uma Odisséia no Espaço. Obra-prima absoluta.





Nascido para Matar (1987)

Dei uma segunda chance para um dos filmes de Kubrick que sempre me despertou pouco interesse. Nem a ocasião especial, com direito a cópia restaurada e toda a pompa da exibição, foi capaz de alterar a minha percepção. É um filme desigual, com uma primeira parte interessante e uma segunda parte decepcionante. Kubrick chegou tarde para dar o seu testemunho sobre a Guerra do Vietnã. O filme não chega aos pés dos seus outros exemplares que tiveram a guerra como objeto principal, Glória feita de sangue (1957) e Dr. Fantástico (1964). Muita estilização para pouco resultado.





Barry Lyndon (1975)

Os filmes históricos têm em comum com os filmes de ficção científica o fato de tentarmos recriar neles alguma coisa que não existe. E as descrições, que são as partes mais enfadonhas dos romances, não exigem, na tela, nenhum esforço do público, mas exigem muito dos cineastas!
Stanley Kubrick

Como eu já disse no início deste texto, Barry Lyndon era o único filme de Kubrick que me faltava. Hipercontrolado, longo e com um ritmo lento de condução. Tinha tudo para ser uma experiência pouco memorável, percepção essa que parece ter prevalecido na ocasião do seu lançamento. Por mais frio e distante que seja, acusação que sempre pautou a opinião dos seus detratores, é uma experiência que exige um tanto de paciência do espectador. Não cabe na tela pequena das TVs domésticas, cujas exibições estão sujeitas a constantes interrupções. Requer devoção absoluta. Um dos melhores Kubricks; muito mais do que “um filme de época”.

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