Essa postagem tardou pra sair em
virtude do aniversário de um ano do meu filho e dos compromissos profissionais
acumulados no período. Ao mesmo tempo, ainda que involuntariamente, esse atraso
permitiu que mais um filme fosse adicionado ao pacote, uma vez que a
Itinerância da Mostra chegou ao SESC Ribeirão com uma pequena amostragem do
grande Evento – 10 títulos. Se meu calendário ajudar, ainda terei a
possibilidade de ver Centro Histórico
(2012), com episódios dirigidos por Pedro Costa, Victor Erice, Manoel de
Oliveira e Aki Kaurismäki, e Cães
Errantes (2013), de Tsai Ming-liang. Torçamos!
A Morte Passou por Perto (1955), Stanley Kubrick (EUA)
O que me levou a essa sessão não
foi propriamente a oportunidade de rever A
Morte Passou por Perto, um dos filmes de Kubrick que não tenho muito em
conta, mas sim os três curtas-metragens do início de sua carreira que compunham
o Programa: Flying Padre: An RKO-Pathe
Screenliner (1951), Day of the Flight (1951) e The Seafarers (1953). Eu desconhecia por completo a proposta dos
três documentários, de forte cunho institucional – procurar qualquer resquício
do que viria a ser o grande diretor é pura perda de tempo, nenhum deles se presta a isso. Ao menos, matei a minha
curiosidade.
Salvo (2013), Fabio Grassadonia e Antonio Piazza (ITÁLIA)
A rigor esse filme não integrava
a programação da Mostra. Ele havia estreado em circuito comercial na semana
anterior, depois da elogiosa passagem pelo Festival do Rio – o entusiasmo do Luiz
Carlos Merten me levou a fazer essa escolha. Eu havia perdido o horário da
cinebiografia do Paradjanov e a grade de programação do Frei Caneca não ajudava
muito – outras praças traziam melhores opções. O filme funciona quando se detém
na construção da improvável relação amorosa entre Salvo, o assassino
profissional do título, e a irmã cega de uma de suas vítimas – o
plano-sequência de abertura, que formaliza o encontro entre as partes, é
impecável. Todo o ambiente fora dessa esfera não contribui muito para o impacto
do conjunto. O domínio de espaço é memorável, mesmo sendo construído
essencialmente por primeiros-planos, com a câmera colada nos personagens. O som
exerce uma poderosa função dramática.
O Lobo Atrás da Porta (2013), Fernando Coimbra (BRASIL)
Um assunto batido que já rendeu até
uma versão cinematográfica vulgar escandalosa: Atração Fatal (1987), de Adrian Lyne. A comparação é muito desonesta,
beirando o desserviço, com imenso prejuízo para o filme de Coimbra. O roteiro não
subestima a inteligência do espectador, preocupado em contextualizar a tragédia
que se anuncia logo nas primeiras imagens. Por meio do depoimento dos
envolvidos, num recurso narrativo que valoriza o clima de suspense gradativo
que o diretor pretende instaurar (aproximando-o de um filme de terror), todos
os atores encontram espaço para brilhar. Esse é, inclusive, um dos alicerces da
produção: as interpretações. As longas tomadas sem cortes, cuidadosamente enquadradas,
valorizam o desempenho dos atores, bem como a exploração do espaço cênico – a
periferia do Rio de Janeiro. Bela estreia de Coimbra na direção de longas – seu
curta Magnífica Desolação (2010) é
muito bom. Tomara que o filme encontre um público volumoso quando do seu
lançamento comercial no início do ano que vem. Potencial pra tanto ele tem.
O Bacanal do Diabo e Outras Fitas Proibidas de Ivan Cardoso (2013), Ivan
Cardoso (BRASIL)
Um pot-pourri das produções do próprio Ivan Cardoso, explorando a
extensão da sua carreira, somado a alguns curtos trechos produzidos recentemente
para compor o tempo do longa-metragem. Assim como havia sido na noite anterior,
nada como fechar a programação diária com uma comédia desmoralizante. Como o
filme é constituído de vinhetas, é natural que algumas funcionem melhor do que
outras. O segmento Bob Dylan is back in
town, que fantasia uma orgia do cantor norte americano no Rio de Janeiro
logo após uma das suas passagens pelo nosso país, é de rachar o bico. O bacanal
do diabo dá as caras. No bate papo que se seguiu depois de findada a sessão, o
diretor externou a sua indignação, no humor escrachado que lhe é
característico, com relação ao vigente mecanismo de financiamento das correntes
produções nacionais (que ele menospreza) – aproveitou para prestar reverência
ao seu mentor, Rogério Sganzerla, cuja filha, Djin Sganzerla, se encontrava
presente. Dificilmente ele será distribuído. Um filme de festival, literalmente.
La Jaula de Oro
(2013), Diego Quemada-Díez (MÉXICO)
Esse foi o filme que eu vi na
Itinerância da Mostra que chegou a Ribeirão via SESC. O diretor Quemada-Díez fez
um road movie da desesperança, embora
seus personagens, três adolescentes guatemaltecos, transbordem humanismo na
tela. O sonho americano é o destino da longa travessia que eles se propõem a
fazer, fugindo da miséria que assola o trajeto entre a Guatemala e o extenso
território do México até a fronteira com os EUA. Não há concessões: para cada
mão que acaricia, há sempre outra na espreita pronta para dar o tapa. O final é
de cortar o coração; a jaula de ouro
do título, uma sugestiva metáfora dos EUA, pode até ser revestida de um
material precioso, nobre, opulento, mas não esconde seu conteúdo vazio, fútil,
oco. A liberdade tão almejada pelos personagens não será encontrada nesta vida.
O texto do Raul Arthuso a respeito de "Escudo de Palha" para a Revista Cinética faz uma ótima aproximação do filme de Takashi Miike com alguns títulos de John Carpenter. A leitura que ele fez do filme foi bem mais feliz do que a minha (http://revistacinetica.com.br/home/escudo-de-palha-wara-no-tate-de-takashi-miike-japao-2013/)
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