Andy Griffith em Um Rosto na Multidão (1957), de Elia Kazan |
A princípio eu ficaria três dias
em São Paulo exclusivamente para desfrutar das opções da Mostra. O quarto dia
não poderia ser de todo aproveitado: o show do Pearl Jam restringiu o meu
programa ao primeiro horário. Quando eu consultei a programação e constava a
exibição de dois filmes de Elia Kazan na noite anterior a que eu havia
planejado viajar, me rearranjei para não perdê-las. Foi a melhor decisão que eu
tomei, sobretudo porque as sessões mais marcantes acabaram sendo de filmes
restaurados: Elia Kazan, Sergei Paradjanov e Rainer Werner Fassbinder. Houve a oportunidade
de assistir a Taxi Driver (1976, Martin
Scorsese) e a Laranja Mecânica (1971,
Stanley Kubrick), contudo como se tratava de sessões concorridíssimas eu
teria de sacrificar algumas escolhas para me regozijar com eles. Nada feito. Agi
dessa forma na esperança de que um dia a capital paulista abrigue (a Mostra
talvez?) uma retrospectiva de ambos os (super cultuados) diretores. Tomara!
Vale mencionar também que os blogs que fizeram a cobertura do evento, de
maneira geral, estavam massacrando as exibições em digital, dentre as quais os
filmes de Scorsese e Kubrick.
Três dias é muito pouco pra
aproveitar todas as opções da Mostra. Alguns dos nomes que me interessavam não
se repetiriam nos dias em que eu me encontrava em São Paulo: Bruno Dumont,
Marco Bellocchio, Naomi Kawase, Jafar Panahi e Hong Sang Soo – nomes que,
acredito eu, não têm tanta chance de chegar ao mercado comercial. Também é
verdade que abri mão de um Nanni Moretti, o elogiadíssimo Habemus Papam (2011), na certeza de que ele estreará no circuito
(alternativo) no ano que vem. Pelo menos assim espero. Só me arrependo de não
ter assistido à Caverna dos Sonhos
Esquecidos (2010), de Werner Herzog. Não estou tão certo de que ele será
exibido regularmente – ainda por cima em 3D.
Terra de um Sonho Distante (1963), de Elia Kazan (EUA) - o filme mais pessoal de Kazan,
aquele que lhe tomou anos de preparação e coragem (reputação também) pra ser
realizado. Apesar de ser um tanto desigual (com altos e baixos), são os bons
momentos que fazem jus a sua fama. Como de costume nas produções de Kazan, as interpretações
são impecáveis. A fotografia em preto e branco é essencial para dar a dimensão
da dificuldade das vidas retratadas. Há tempos que o filme andava sumido,
encontrou o lugar certo para ser projetado: na tela imensa do CINESESC.
Um Rosto na Multidão (1957), de Elia Kazan (EUA) - obra-prima surpreendente. Mesmo
sabendo que Kazan era incapaz de realizar um filme irrelevante, não é possível
adivinhar o rumo que ele adota para a narrativa. Começa morno, relativamente alegre
e só aos poucos vai assumindo ares sombrios, deploráveis. Assim como já fizera
em Viva Zapata! (1952), Kazan
constrói a trajetória de uma marionete. Do longínquo México rural do início do
século 20 em Zapata, diretamente para
o cerne dos EUA em meados da década de 50 em Um Rosto. A melhor ferramenta que o mundo desenvolveria no século
20 para difundir (ou melhor, vender) uma ideia: a televisão. Ela transformaria
a campanha de John F. Kennedy três anos após a realização deste filme – sem conotação
negativa neste caso. Fiquei surpreso de constatar como o pensamento crítico já questionava,
desde seus primórdios, o modo como ela poderia ser (mal) empregada – um dos
melhores exemplos, diga-se de passagem. Minha reação súbita, uma vez terminada
a sessão, deve ter sido a mesma de todos que já viram o filme: quem é esse tal
de Andy Griffith?
Amanhã Nunca Mais (2011), de Tadeu Jungle (BRASIL) - embora eu concorde que o filme
lembre Depois de Horas (1985), de
Martin Scorsese, estou certo de que essa comparação prejudica (e muito) a sua apreciação.
Em suma, o filme de Scorsese funciona e o de Jungle não funciona. O vilão da
estória é a cidade de São Paulo e seus tipos estranhos; Lázaro Ramos segura o
filme à duras penas – inacreditavelmente, o personagem passa por maus bocados por
causa de um (maldito) bolo de aniversário. A busca do protagonista de Scorsese
é abstrata, intangível – a imaginação do público trabalha a favor do filme, não
contra ele.
Girimunho (2011), de Clarissa Campolina e Helvécio Marins Jr. (BRASIL) - o filme que representou o Brasil
na seção Horizontes do Festival de
Veneza deste ano. O começo é muito bom, muito interessante, porém tive dificuldades
para “entrar” no filme. Confesso que estava bastante cansado às 22h30, depois
de três sessões seguidas. Merece uma segunda conferida. Apesar de tudo, minha
referência nesse tipo de narrativa ainda permanece sendo O Grão (2007), de Petrus Cariry.
Periferic (2011), de Bogdan George Apetri (ROMÊNIA) - eu sou dos que se maravilharam
pela safra recente de filmes vindos da Romênia. Alguns dos meus textos mais
antigos comprovam isso. A estória desse longa-metragem é de Cristian Mungiu,
diretor do aclamado 4 meses, 3 semanas e
2 dias (2007). Será que o sucesso dessa nova
onda romena estava restrito à abordagem deletéria do comunismo, dos anos
sob o regime ditatorial de Nicolau Ciaucesco? O filme está longe de ser ruim, mas carece
do diferencial que projetou os seus antecessores no mercado internacional. O
estilo dos irmãos Dardenne é que dá as cartas (como nos outros exemplares da
safra).
UM ROSTO NA MULTIDÃO é o único filme de Kazan que não conheço. Adoraria vê-lo.
ResponderExcluirO Falcão Maltês
Antônio, eu também não havia visto até então. Reforçando o que eu disse é surpreendente, um dos melhores Kazans. Ainda me faltam três: A Luz é para Todos, Boneca de Carne e Os Visitantes.
ResponderExcluirAbraço.