quarta-feira, novembro 16, 2011

35ª Mostra de Cinema Internacional em São Paulo – Parte 1


Andy Griffith em Um Rosto na Multidão (1957), de Elia Kazan


A princípio eu ficaria três dias em São Paulo exclusivamente para desfrutar das opções da Mostra. O quarto dia não poderia ser de todo aproveitado: o show do Pearl Jam restringiu o meu programa ao primeiro horário. Quando eu consultei a programação e constava a exibição de dois filmes de Elia Kazan na noite anterior a que eu havia planejado viajar, me rearranjei para não perdê-las. Foi a melhor decisão que eu tomei, sobretudo porque as sessões mais marcantes acabaram sendo de filmes restaurados: Elia Kazan, Sergei Paradjanov e Rainer Werner Fassbinder. Houve a oportunidade de assistir a Taxi Driver (1976, Martin Scorsese) e a Laranja Mecânica (1971, Stanley Kubrick), contudo como se tratava de sessões concorridíssimas eu teria de sacrificar algumas escolhas para me regozijar com eles. Nada feito. Agi dessa forma na esperança de que um dia a capital paulista abrigue (a Mostra talvez?) uma retrospectiva de ambos os (super cultuados) diretores. Tomara! Vale mencionar também que os blogs que fizeram a cobertura do evento, de maneira geral, estavam massacrando as exibições em digital, dentre as quais os filmes de Scorsese e Kubrick.

Três dias é muito pouco pra aproveitar todas as opções da Mostra. Alguns dos nomes que me interessavam não se repetiriam nos dias em que eu me encontrava em São Paulo: Bruno Dumont, Marco Bellocchio, Naomi Kawase, Jafar Panahi e Hong Sang Soo – nomes que, acredito eu, não têm tanta chance de chegar ao mercado comercial. Também é verdade que abri mão de um Nanni Moretti, o elogiadíssimo Habemus Papam (2011), na certeza de que ele estreará no circuito (alternativo) no ano que vem. Pelo menos assim espero. Só me arrependo de não ter assistido à Caverna dos Sonhos Esquecidos (2010), de Werner Herzog. Não estou tão certo de que ele será exibido regularmente – ainda por cima em 3D.

Terra de um Sonho Distante (1963), de Elia Kazan (EUA) - o filme mais pessoal de Kazan, aquele que lhe tomou anos de preparação e coragem (reputação também) pra ser realizado. Apesar de ser um tanto desigual (com altos e baixos), são os bons momentos que fazem jus a sua fama. Como de costume nas produções de Kazan, as interpretações são impecáveis. A fotografia em preto e branco é essencial para dar a dimensão da dificuldade das vidas retratadas. Há tempos que o filme andava sumido, encontrou o lugar certo para ser projetado: na tela imensa do CINESESC.

Um Rosto na Multidão (1957), de Elia Kazan (EUA) - obra-prima surpreendente. Mesmo sabendo que Kazan era incapaz de realizar um filme irrelevante, não é possível adivinhar o rumo que ele adota para a narrativa. Começa morno, relativamente alegre e só aos poucos vai assumindo ares sombrios, deploráveis. Assim como já fizera em Viva Zapata! (1952), Kazan constrói a trajetória de uma marionete. Do longínquo México rural do início do século 20 em Zapata, diretamente para o cerne dos EUA em meados da década de 50 em Um Rosto. A melhor ferramenta que o mundo desenvolveria no século 20 para difundir (ou melhor, vender) uma ideia: a televisão. Ela transformaria a campanha de John F. Kennedy três anos após a realização deste filme – sem conotação negativa neste caso. Fiquei surpreso de constatar como o pensamento crítico já questionava, desde seus primórdios, o modo como ela poderia ser (mal) empregada – um dos melhores exemplos, diga-se de passagem. Minha reação súbita, uma vez terminada a sessão, deve ter sido a mesma de todos que já viram o filme: quem é esse tal de Andy Griffith?

Amanhã Nunca Mais (2011), de Tadeu Jungle (BRASIL) - embora eu concorde que o filme lembre Depois de Horas (1985), de Martin Scorsese, estou certo de que essa comparação prejudica (e muito) a sua apreciação. Em suma, o filme de Scorsese funciona e o de Jungle não funciona. O vilão da estória é a cidade de São Paulo e seus tipos estranhos; Lázaro Ramos segura o filme à duras penas – inacreditavelmente, o personagem passa por maus bocados por causa de um (maldito) bolo de aniversário. A busca do protagonista de Scorsese é abstrata, intangível – a imaginação do público trabalha a favor do filme, não contra ele.

Girimunho (2011), de Clarissa Campolina e Helvécio Marins Jr. (BRASIL) - o filme que representou o Brasil na seção Horizontes do Festival de Veneza deste ano. O começo é muito bom, muito interessante, porém tive dificuldades para “entrar” no filme. Confesso que estava bastante cansado às 22h30, depois de três sessões seguidas. Merece uma segunda conferida. Apesar de tudo, minha referência nesse tipo de narrativa ainda permanece sendo O Grão (2007), de Petrus Cariry.

Periferic (2011), de Bogdan George Apetri (ROMÊNIA) - eu sou dos que se maravilharam pela safra recente de filmes vindos da Romênia. Alguns dos meus textos mais antigos comprovam isso. A estória desse longa-metragem é de Cristian Mungiu, diretor do aclamado 4 meses, 3 semanas e 2 dias (2007). Será que o sucesso dessa nova onda romena estava restrito à abordagem deletéria do comunismo, dos anos sob o regime ditatorial de Nicolau Ciaucesco? O filme está longe de ser ruim, mas carece do diferencial que projetou os seus antecessores no mercado internacional. O estilo dos irmãos Dardenne é que dá as cartas (como nos outros exemplares da safra).

2 comentários:

  1. UM ROSTO NA MULTIDÃO é o único filme de Kazan que não conheço. Adoraria vê-lo.

    O Falcão Maltês

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  2. Antônio, eu também não havia visto até então. Reforçando o que eu disse é surpreendente, um dos melhores Kazans. Ainda me faltam três: A Luz é para Todos, Boneca de Carne e Os Visitantes.
    Abraço.

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